O
aikido é uma arte marcial tradicional japonesa que apresenta uma
proposta de trabalho um pouco diferente das outras artes marciais. Eu já
passei por diversas escolas marciais e todas as lições que aprendi no
mundo das lutas me foram válidas a ponto de eu chegar a conclusão de que
todas as artes marciais são boas, eficientes e tem algo a ensinar, no
entanto foi pelo aikido que me apaixonei e ele já faz parte de mim
dentro e fora do dojô (lugar onde se pratica a arte).
A primeira coisa que me atraiu ao aikido foi o seu caráter não competitivo.
Os trabalhadores, estudantes, profissionais convivem com a competição,
comparação, obtenção de resultados, mas não é isso que eu vou buscar no
dojô. A competição coloca um indivíduo contra o outro e a nossa prática marcial se dá com
o outro. O aikidoísta empresta seu corpo ao outro com sinceridade para
que esse aprenda e desenvolva a sua técnica e o outro o recebe com
respeito e zelo.
Há
alguns anos questionei-me por quanto tempo meu corpo teria condições de
executar movimentos de luta que exigissem grande explosão muscular e
saltos e via a dificuldade dos meus pares de treino e as minhas em
executá-las. O aikido é uma arte marcial que molda-se ao seu corpo e que
pode, efetivamente, ser praticada por qualquer cidadão, independente de
seu peso e idade. O uso inteligente da força harmoniza o conflito e
procura reestabelecer o estado de paz anterior. Não é comum encontrar em
dojôs de aikidô, pessoas fazendo séries de exercícios aeróbicos e de
musculação, pois não é isso que o aikidoca busca desenvolver. O apuro
técnico, a suavidade e a fluidez são mais desejáveis.
Nós trabalhamos com a ideia de circularidade e procuramos evitar o
conflito. Quando uma energia é posta sobre um aikidoca, este primeiro
cede - não bloqueia o ataque com força igual para que ela se anule - ele
sente a energia e se aproveita dela girando e conta com o desequilíbrio
residual do atacante para neutralizar e encerrar o combate. Esse método
pode ser aplicado para gerenciar conflitos pessoais e profissionais. O
autocontrole desenvolvido na academia, quando se está exposto a ataques,
ajuda a absorver, sem bloquear primeiramente. Isso equivale a aprender a
ouvir antes de se manifestar, sentir e analisar os desafios que a vida
está colocando naquele momento. O giro, os movimentos de tenkan
equivalem a deixar que as energias desarmônicas do dia-a-dia passem por
nós sem que elas nos abalem negativamente, mas também sem negligência.
Não se trata de afastar-se de um problema e deixar que ele se resolva
sozinho ou que outro o faça, mas olhá-lo de maneira racional, de perto e
almejando o controle imediato da situação. As finalizações adotadas no
aikido não visam humilhar ou expor o atacante, que o indivído caia para
se levantar uma pessoa melhor. Esta deve ser a postura do aikidoísta
diante de uma situação no dia-a-dia: o respeito, afinal cada barreira
vencida é um aprendizado. O triunfo não pode vir acompanhado desprezo ou
soberba, mas de posterior acolhimento. A harmonia e a humildade são a
nossa verdadeira vitória.
Essa
filosofia acrescida de uma atividade física saudável gera bem estar e
saúde. Devo contar que em minha função de educador, a quantidade de
coisas que tinha de escrever no quadro provocavam-me frequentes dores
nas mãos, punho, ombro que desapareceram pelo fortalecimento destes
provocados pelo aikido. E o meu caso não é o único. Meu sensei, músico,
desenvolveu lesão nas mãos pelos repetidos movimentos com seu violão.
Lesões que hoje não se verificam graças ao aikido.
Só
esses benefícios já justificariam a minha escolha pelo aikido, mas devo
acrescentar que dizer que o mundo violento em que vivemos foi o que me
fez procurar as artes marciais pela primeira vez e o aikido mostrou-se
muito racional e eficiente do ponto de vista da defesa pessoal. O treino
constante permite que o cidadão tenha mais autoconfiança, ande de
cabeça erguida por superar o medo da violência.
Por
tudo que tenho recebido dentro do aikido, que se nota - não é pouca
coisa - venho agradecer ao meu sensei Guilherme Mattos, homem íntegro
que teve a coragem de trazer o aikido para a minha cidade onde dezenas
de outras lutas já estavam estabelecidas. Agradeço pela paciência,
diante de minha dificuldade; perseverança, diante da teimosia e
infindável vontade de fazer a nossa arte crescer.
Vinícius Ramon Fontanela
Professor e Aikidoca
Veja também outros depoimentos semelhantes aqui.